Justiça nunca deu sentença definitiva de prisão por formação de cartel no país

27/04/2009
Justiça nunca deu sentença definitiva de prisão por formação de cartel no país

DA REPORTAGEM LOCAL

Por condenação definitiva da Justiça nunca houve prisão no Brasil para a prática de cartel. Só prisões temporárias ou preventivas para ajudar em investigações. Ainda assim, na opinião de especialistas, desde 2003 há uma revolução no direito antitruste. Projeto do governo no Senado deve melhorar a defesa da concorrência.
"Até 2002, o sistema brasileiro de defesa da concorrência, que congrega a Seae [Secretaria de Acompanhamento Econômico], a SDE [Secretaria de Direito Econômico] e o Cade [Conselho Administrativo de Defesa Econômica], se dedicava ao controle da concentração de mercado nos setores. Por falta de estrutura, não tinha condição de atuar no combate a condutas, que passou a ser prioridade a partir de 2003. Já há uma enxurrada de processos de suspeita de cartel em investigação", diz Pedro Zanotta, presidente da Comissão de Estudos da Concorrência e Regulação Econômica da OAB-SP.
Desde 2000, segundo o Cade, foram distribuídos 358 processos administrativos no conselho -118 resultaram em condenação, 239 foram arquivados e 2 casos tiveram instrução reaberta na SDE. Atualmente, 32 processos aguardam julgamento no Cade.
Na SDE, existem 294 casos por suspeita de prática de cartel em investigação, segundo Ana Paula Martinez, diretora do Departamento de Proteção e Defesa Econômica da SDE.
"Desde 2003, o combate ao cartel é prioridade. E isso pode ser visto no aumento do número de mandados de busca e apreensão", afirma. Foram 19 em 2006, 84 em 2007 e 93 em 2008. De janeiro a março deste ano, foram cumpridos 11 mandados de busca e apreensão.
"Nosso objetivo em 2008 era atuar mais em operações e cumprir mandados. Neste ano, queremos encerrar casos já abertos. O foco será enviar processos para o Cade, que julga os casos", afirma Martinez.
Pela primeira vez neste ano, segundo ela, a SDE trabalhou em conjunto com o FBI [a polícia federal dos EUA] e com a Comissão Europeia no caso do suposto cartel de compressores para refrigeradores, prática que deve se intensificar. "Em 2008, fizemos uma campanha para conscientizar a população do prejuízo que o cartel causa e a forma de combater. Com isso, no ano passado, recebemos 312 denúncias por meio de serviço colocado na internet", diz.
Hoje, 26 pessoas investigam as denúncias de cartel na SDE. "Estamos tentando conseguir mais gente. A lei que cria o "Super-Cade" prevê a criação de mais 200 cargos de gestores para serem incorporados."
Ex-presidente do Cade, Gesner de Oliveira diz que as mudanças na legislação para defesa da concorrência no Brasil é positiva porque é preciso "desburocratizar o sistema, reduzir número de guichês entre Cade, SDE e Seae". Ele considera importante, porém, que seja mantida na nova legislação a possibilidade de processo criminal para os envolvidos em cartel. "O crime deve ser mantido, assim como a delação premiada, que ajuda a punir os cartéis."
Para o advogado Eduardo Molan Gaban, especialista em defesa da concorrência, a legislação nessa área precisa de ajustes. "O Cade deveria ter um quadro de funcionários de carreira no segundo e no terceiro escalão para que o órgão tenha memória. Isso possibilitaria ao Cade ter uma linha mais jurisprudencial."
Para ele, quem participou e colaborou em investigações de prática de cartel deveria ficar totalmente livre de processo criminal.

Foto - Ana Paula Martinez, diretora do Departamento de Proteção e Defesa Econômica da SDE

Fátima Fernandes

Fonte: Folha de S.Paulo