PINTA PRETA DOS CITROS

03/08/2007
“A doença fúngica exige controle rigoroso para evitar prejuízos aos produtores, que destinam sua produção para processamento industrial, ao mercado nacional de frutas frescas e para exportação aos países da União Européia.” O Estado de São Paulo responde por cerca de 80% da produção nacional dos citros, que está ameaçada por vários problemas fitossanitários. Dentre as doenças fúngicas relatadas, a mancha preta ou pinta preta é hoje a que mais prejuízos causa à citricultura paulista. Os frutos afetados, em geral, caem prematuramente, reduzindo a produtividade das plantas. Em ataques severos, perdas de até 80% já foram observadas. Frutos com sintomas da doença são muito depreciados no mercado nacional de fruta fresca e são impróprios para exportação. As perdas são maiores em limoeiros verdadeiros, tangoreiros ‘Murcott’, mexiriqueira ‘Rio’ e ‘Montenegrina’, algumas tangerineiras e laranjeiras doces, principalmente as de maturação tardia, como ‘Valência’, ‘Natal’, e ‘Folha Murcha’. A doença nunca foi encontrada em lima ácida Tahiti. A pinta preta já foi relatada no Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Goiás, Espírito Santo, Santa Catarina, Amazonas e Paraná. Plantas velhas e estressadas são as mais afetadas. RESTRINGINDO EXPORTAÇÕES A pinta preta tem restringido as exportações de frutas cítricas brasileiras, principalmente quando destinadas ao mercado europeu. A doença é considerada quarentenária A1 na União Européia (UE), por não estar ainda presente em seus países membros. A tolerância em relação a frutos cítricos importados por esses países é zero. A detecção da doença em um único fruto acarreta o rechaço de toda a partida, que fica impedida de desembarque. O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e os órgãos estaduais de Defesa Agropecuária estabeleceram um programa de manejo de risco da doença para atender as exigências dos países importadores europeus. Entre as medidas, está a exigência de cadastramento dos produtores, das unidades de produção (UP) e das casas de embalagem. As UPs (pomares cadastrados para a exportação) devem estar sob acompanhamento oficial para assegurar que não apresentam a doença.Inspeções de campo são feitas nas UPs durante todo o ciclo de produção. Quando a doença é detectada, a UP contaminada é excluída do processo de exportação. Caso não seja detectada nas inspeções de campo, frutos são amostrados na pré-colheita, em 1% das plantas (1 fruto/planta), e as amostras são encaminhadas a laboratórios oficiais para realização do teste de indução de sintomas da doença. O teste visa detectar a presença do fungo causador da doença em frutos que, embora infectados, ainda não apresentam os sintomas, pois o período de incubação da pinta preta pode ser muito elevado. Se o resultado do teste for positivo, a UP correspondente é também excluída do processo de exportação. A Unidade de Pesquisa e Desenvolvimento de Sorocaba, do Instituto Biológico, realiza, desde 2005, o teste de indução de sintomas da pinta preta em frutos amostrados em pomares cadastrados para a exportação. Nos dois últimos anos, a instituição realizou teste em 16.798 frutos cítricos, amostrados em 374 unidades de produção. SINTOMAS DA DOENÇA A pinta preta, ou mancha preta dos citros, ou “careta”, afeta folhas, pecíolos, ramos, espinhos, pedúnculos e, principalmente, frutos. O período de incubação da doença, ou seja, o período entre a infecção e a manifestação dos sintomas, é, em geral, longo, podendo, em algumas condições, ser superior a um ano. A manifestação dos sintomas é favorecida pela radiação solar combinada com altas temperaturas. Portanto, os frutos mais expostos ao sol são mais severamente afetados. Em frutos, seis tipos principais de lesões, com denominações diferentes, podem ocorrer: 1) manchas duras: são as mais comuns e típicas da doença; em geral, aparecem no início da maturação. Em frutos verdes, um halo amarelado aparece circundando as lesões. Em frutos maduros, um halo verde aparece ao redor das lesões, que apresentam o centro deprimido de cor marrom-claro ou cinza-escuro, os bordos salientes de coloração marrom-escura pequenas pontuações negras no centro; 2) manchas de falsa melanose: são lesões muito pequenas, escuras lisas e numerosas, que em geral aparecem quando os frutos estão ainda verdes; 3) manchas trincadas: são lesões superficiais, escuras, de diferentes tamanhos e bordas não bem definidas, que aparecem quando os frutos ainda estão verdes, e, ao envelhecerem, formam trincas na sua superfície. Essas lesões aparecem sempre associadas ao ácaro da falsa ferrugem; 4) manchas rendilhadas: são lesões superficiais, de bordos não bem definidos, coloração alaranjada com o centro amarelo-marrom a marrom-escuro, que podem tomar grandes áreas da superfície do fruto, e em geral ocorrem em frutos verdes; 5) manchas sardentas: são lesões levemente deprimidas e avermelhadas, que em geral aparecem em frutos maduros ou frutos já colhidos. Podem unir-se formando grandes lesões ou permanecerem pequenas e individualizadas. Sua ocorrência é maior em frutos colhidos armazenados em temperaturas acima de 20°C; 6) manchas virulentas: lesões que em geral se desenvolvem no final da safra, quando os frutos já estão maduros e as temperaturas são elevadas. Resultam do crescimento ou união de lesões dos tipos mancha dura e falsa melanose, dando origem a grandes lesões deprimidas de centro acinzentado e bordos salientes de coloração marrom-escuro ou vermelho-escuro. No centro dessas lesões também aparecem pontuações escuras. A casca do fruto pode ficar completamente necrosada na área lesionada, mas sua parte interna não é afetada. Os sintomas em folhas, ramos e espinhos são muito raros. As lesões nesses órgãos são muito semelhantes às do tipo manchas duras em frutos, apresentando o centro necrótico deprimido de cor cinza, os bordos salientes marrom-escuro, um halo amarelado ao redor das lesões e frutificações (picnídios) do fungo no centro das lesões. O AGENTE CAUSAL Guignardia citricarpa (Phyllosticta citricarpa) é o fungo agente causal da pinta preta. Ele é específico de plantas cítricas, podendo infectar vários órgãos da planta. O fungo pode frutificar produzindo esporos (unidades reprodutivas) sexuais denominados ascósporos, considerados os mais importantes na epidemiologia da doença. Esses esporos somente são produzidos em folhas infectadas em decomposição e são disseminados pelo vento. O fungo também pode produzir esporos assexuais denominados picnidiósporos, em lesões de ramos, espinhos, pedúnculos, frutos e folhas vivas da planta, e também em folhas mortas em decomposição. Esses esporos somente são disseminados a curtas distâncias pela ação da água, principalmente por respingos de água. Nas nossas condições, os picnidiósporos constituem-se em importante fonte adicional de inóculo. CONTROLE DA PINTA PRETA As medidas de controle de pinta preta devem levar em consideração o período de suscetibilidade dos frutos, as fontes de inóculo do fungo agente causal e as condições ambientais. Os frutos são suscetíveis até cerca de cinco meses após a queda das pétalas das flores. As principais medidas de controle incluem: a) utilizar mudas livres da doença nos plantios e replantios, principalmente em locais onde a doença não foi ainda constatada; b) em áreas onde a ocorrência da doença é recente, remover e queimar os órgãos infectados das plantas durante o outono-inverno, antes do início do florescimento das plantas, para reduzir as fontes de inóculo; c) controlar o mato das linhas de plantio com herbicidas pós-emergentes, e o mato das ruas com roçadeiras, de modo a produzir cobertura morta (“mulching”) sobre as folhas caídas ao solo na área de projeção da copa das plantas, antes do início do florescimento destas, para reduzir a produção e a dispersão de esporos do fungo nas folhas em decomposição sobre a superfície do solo; d) eliminar plantas em estado de depauperamento avançado do pomar; e) manter as plantas em boas condições de nutrição e sanidade; f) pulverizar as plantas com fungicidas para a proteção dos frutos durante o seu período de maior suscetibilidade. Fungicidas dos grupos benzimidazóis (carbendazim e tiofanato metílico), estrobilurinas (pyraclostrobin, azoxystrobin e trifloxystrobin), ditiocarbamatos (mancozeb e propineb) e produtos à base de cobre (oxicloreto de cobre, hidróxido de cobre, óxido cuproso e sulftato de cobre na forma de calda bordalesa) estão registrados e são usados com sucesso no controle da doença. O controle químico da pinta preta pode variar em função do destino da produção. Quando destina-se ao processamento industrial, o controle pode ser realizado com um número menor de pulverizações, pois o aspecto externo dos frutos não é tão importante. O controle deve ser iniciado logo após a queda das pétalas das flores e o número de aplicações pode variar em função do histórico da doença na área, das condições climáticas prevalecentes durante o período de desenvolvimento do fruto, da suscetibilidade do hospedeiro, e do nível de controle requerido. Em pomares para exportação ou para o mercado interno de frutas frescas, os produtos à base de cobre em mistura com óleo podem ser usados somente nas primeiras pulverizações. A restrição ao uso desses fungicidas nas pulverizações subsequentes deve-se ao fato dos mesmos poderem provocar fitotoxicidade aos frutos, e também por eles tornarem mais evidentes manchas, lesões e injúrias provocadas por outras causas, bióticas ou abióticas. Nas demais pulverizações, recomenda-se utilizar benzimidazóis ou estrobilurinas misturadas com óleo emulsionável. Contudo, como o uso continuado e inadequado desses fungicidas pode provocar o desenvolvimento de resistência do fungo aos produtos, recomenda-se não realizar mais do que duas pulverizações por safra com fungicidas de mesmo grupo químico. Recomenda-se, também, que esses fungicidas sejam utilizados alternadamente, ou em misturas com produtos de contacto que apresentem baixo risco de desenvolvimento de resistência pelo fungo, como os ditiocarbamatos. *** Matéria retirada da Revista Frutas e Derivados Site: http://www.ibraf.org.br/revista/revista.asp Eduardo Feichtenberger - Engenheiro Agrônomo, Pesquisador Científico. Unidade de Pesquisa e Desenvolvimento de Sorocaba. Instituto Biológico. Tel (15) 3227-120. E-mail: e.feichtenberger@gmail.com