As instituições e os cartéis.

24/04/2007
A Lei Antitruste (n 8.884) foi alterada em 2000 para proibir o Cade de assinar acordos em casos de cartel. Na época, havia uma preocupação das autoridades com um excesso de pedidos de empresas para encerrar investigações. À medida que eram processadas, as empresas pediam ao Cade e à Secretaria de Direito Econômico (SDE) do Ministério da Justiça autorização para assinar um Termo de Cessação de Conduta. Com esse termo, elas prometiam às autoridades que não iriam mais cometer abusos no mercado. E, assim, encerravam o processo de investigação de cartel. Mas na maioria dos casos o acordo não era fiscalizado e, portanto, não era cumprido. Em 2000, o Ministério da Justiça considerou imoral a assinatura de termos desse tipo e conseguiu no Congresso a aprovação de uma lei vedando-o. No caso do cartel das indústrias processadoras de citros, elas, ao mesmo tempo em que assinavam o acordo com o CADE, assinaram um contrato entre seus membros reorganizando e reforçando o cartel, conforme documentos entregues, após um contrato de leniência, por um ex-diretor de uma das empresas. Essas provas deram origem à “Operação Fanta”, na qual o SDE com o apoio da Policia Federal arrecadou grande quantidade de documentos que, depois de mais de um ano mantidos lacrados graças a manobras jurídicas, foram liberados pela justiça federal para o exame das autoridades que investigam o setor, mas até agora permanecem intocados. Durante este período, fatos importantes ocorreram e a revisão da lei que rege a concorrência, principalmente no que tange ao impedimento de acordos em caso de cartel, passou a ser tratada como caso de emergência nacional, tanto que foi incluída no PAC. Antes, o deputado Nelson Marqueselli havia tentado incluir em uma MP uma emenda que eliminava da lei 8.884. o parágrafo que tanto tem atrapalhado o desenvolvimento do país, no que foi frustrado pela ação dos citricultores vítimas do cartel. Apesar dessa tentativa frustrada, o SDE, com a anuência do CADE, negociou um acordo com o cartel da laranja pelo qual esse setor, que ocasionou um prejuízo superior a US$ 15 bilhões ao país, pagaria R$ 100 milhões , e teria a investigação suspensa e os documentos apreendidos entregues sem serem analisados. Mais uma vez os citricultores reagiram e o CADE foi convencido pelo procurador da república junto ao CADE, dr. José Elaeres, da ilegalidade do acordo que foi rejeitado por unanimidade. Porém, as autoridades do Sistema Brasileiro da Defesa da Concorrência passaram a ser defensoras intransigentes da volta da possibilidade de acordo nos casos de cartel, sob a alegação de que são incapazes de fazer com que as empresas, quando multadas, paguem as multas! Não só propõem que a lei seja alterada, mas sugerem que isso seja apressado por uma MP específica. Diante de tanta urgência, não temos dúvida de que o governo será rápido em corrigir essa lei que tanto entrava o crescimento do país e a defesa da concorrência. Na verdade, a alteração pretendida, longe de fortalecer a concorrência, vai dar aos cartéis, que corroem a nossa economia, a certeza de que poderão continuar suas práticas nefastas e que, no remoto caso de serem autuados, deverão pagar uma pequena multa e poderão voltar tranqüilamente à sua atividade, como é o caso do cartel dos citros, que, apesar de estar sob investigação, não mudou em nada suas práticas, e continua a combinar preços, dividir mercados, manipular informações etc. Tudo indica que a queda repentina da cotação do suco de laranja, contrariando os fundamentos do mercado, seja resultado de ação das processadoras interessadas em manter os preços da laranja abaixo do custo de produção, apesar do aumento do preço do suco no mercado internacional. A meu ver, se uma multa fosse aplicada, ela deveria ser proporcional ao dano causado no período de vigência do cartel, prevendo o ressarcimento dos prejuízos causados. Além disso, só a multa não é suficiente, como no caso das indústrias de suco: o acordo deve incluir medidas que efetivamente aumentem a concorrência, impedindo a verticalização, que têm aumentado os pomares próprios, e franqueando aos concorrentes o acesso ao sistema da distribuição de suco a granel. Se há realmente boa intenção nessa alteração, deveria ficar expresso na lei que as empresas que já assinaram, em qualquer tempo, um acordo para suspensão das investigações, não poderão ser beneficiadas pela nova lei, como é o caso do cartel dos citros. Flávio de Carvalho Pinto Viegas Presidente ASSOCITRUS