Citricultura uma proposta!

20/02/2010

O Brasil tornou-se o maior produtor mundial de laranjas e o maior produtor e exportador de suco de laranja, dominando mais de 80% desse mercado, baseado numa citricultura que se caracterizava por ser constituída por pequenos e médios produtores altamente capacitados que residiam nos municípios citrícolas, devido à alta exigência e complexidade tecnológica da atividade. Essa classe média da agricultura promoveu a geração e distribuição de renda e emprego nas regiões citrícolas do país. Os municípios citrícolas apresentavam os maiores PIBs e IDHs do país.

A partir do início da década de 90, em virtude da recessão que afetou a Ásia, que se afigurava como o novo mercado para o suco brasileiro, a indústria cartelizou-se e iniciou um processo de concentração e verticalização da produção.

A etapa mais importante desse processo foi marcada pela venda, em 1993, da Frutesp, empresa controlada por uma cooperativa de citricultores, que dava transparência ao mercado e assegurava ao citricultor participação na renda da cadeia produtiva.

O processo foi agravado em 1994 pela decisão do CADE em suspender, mediante um acordo, o processo sobre a cartelização do setor. Esse acordo nunca foi cumprido e foi encerrado em 2000, apesar de uma nova denúncia de cartel ter sido apresentada em 1999, aqui na Câmara Federal, pelo dep. Russomanno e encaminhada ao Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SEAE, SDE e CADE) onde gerou um novo processo de investigação que ainda está na SDE.

O mais grave é que o acordo proibiu, ironicamente, como era o interesse da indústria,

o contrato de participação que havia no setor, que assegurava uma negociação coletiva do preço da laranja, mediada pelo governo, e balizada pelos preços do suco no mercado internacional. A alegação do CADE era de que a negociação entre citricultores e a indústria feria as leis da defesa da concorrência e que os próprios citricultores demonstravam descontentamento com o contrato.

Esta foi uma interpretação absurda dos fatos. As negociações objetivavam apenas a fixação de uma norma para definir a participação dos citricultores na renda da cadeia que é voltada para a exportação. Em relação ao contrato, a reivindicação dos produtores era no sentido de aprimorá-lo em virtude das mudanças tecnológicas e de mercado ocorridas na época.

O que se seguiu foi o fortalecimento da indústria, que como primeira retaliação aos produtores, transferiu a eles, sem nenhuma compensação, os custos de colheita e frete.

As indústrias assinaram, entre si, um contrato mediante o qual fixavam as participações de cada uma delas no mercado de suco de laranja, dividiam os citricultores, combinavam os preços pagos aos produtores e de venda do suco, estabeleciam regras de compensação em caso de necessidade de ajustes. Este contrato era administrado através de auditorias e reuniões periódicas dos executivos da indústria.

Assim iniciou-se o processo de concentração e verticalização da indústria de suco de laranja. O processamento de citros concentra-se hoje nas quatro empresas (Cutrale, Fischer, Louis Dreyfus e Citrovita) que com suas parcerias estratégicas com os grandes engarrafadores (Coca Cola e Pepsi Cola entre outros) dão a essas empresas o controle do setor, desde a produção da fruta até o suco na embalagem final na prateleira do supermercado. Estas empresas controlam também cerca de 50% do processamento de citros na Flórida, o segundo maior produtor mundial de suco.

A remuneração dos citricultores que, em valores atualizados era de US$ 4,5 por caixa de 40,8 kg, livre de colheita e frete, até meados da década de 90, caiu para um patamar de US$ 2,5, apesar do brutal crescimento dos custos devido às doenças e pragas que apareceram nos últimos anos e que elevaram os custos de um patamar inferior a US$ 2 por caixa para o nível atual de custo de US$ 8 por caixa.

Os baixos preços provocaram uma brutal transferência de renda dos produtores para a indústria e impediram que os citricultores renovassem os seus pomares e como decorrência perdessem produtividade e acumulassem dividas o que provocou a expulsão da maior parte dos pequenos e médios produtores do setor. Só no estado de S Paulo, desde meados da década de 90, mais de 20 mil citricultores já foram obrigados a abandonar o setor e muitos outros serão inviabilizados se nada for feito.

Financiados pela renda apropriada dos citricultores, pelo subfaturamento do suco exportado e pelo próprio BNDES as grandes indústrias fecharam e adquiriram seus concorrentes, ampliaram seu parque industrial, implantaram um sistema de transporte a granel em escala mundial que se de um lado contribui para que o Brasil mantenha o controle do mercado, por outro lado constitui-se numa enorme barreira de entrada para novos concorrentes, implantaram seus pomares e hoje já produzem cerca de 50% da laranja que processam e continuam plantando novos pomares.

Na década de 70 as industrias detinham menos de 600 mil arvores e estima-se que atualmente os seus pomares tenham atingido 80 milhões de arvores o que lhes dá um poder enorme de negociação na compra da matéria prima.

Este grau de concentração do setor e o poder econômico e político daí decorrentes tem proporcionado enormes distorções no mercado e na atuação das nossas instituições que tem tido enorme dificuldades em coibir os abusos e as ilegalidades cometidas.

 

Regulamentação.

 

Estamos tentando, há mais de uma década, uma auto-regulamentação do setor através do Consecitrus, porém as várias tentativas de negociação foram abandonadas pela indústria.

Hoje com as informações coletadas nas investigações sobre o cartel e novas investigações sobre as transferências de suco, a valores abaixo dos reportados no mercado de suco a granel, entre as processadoras e empresas que revendem o suco aos engarrafadores, permitem que as autoridades tomem medidas no sentido de:

•Â Â Â Â 

Restabelecer a concorrência no setor,

 

•Â Â Â Â 

Coibindo a divisão dos produtores

 

•Â Â Â Â 

Impedindo a fixação de políticas comerciais uniformes

 

•Â Â Â Â 

Reduzindo as barreiras de entrada para novos concorrentes

 

•Â Â Â Â 

Limitar a verticalização,

 

•Â Â Â Â 

Impedir a expansão dos pomares da indústria

 

•Â Â Â Â 

Limitar a concentração do setor citricola

 

•Â Â Â Â 

Incentivar a aquisição de fruta dos pequenos e médios produtores

 

•Â Â Â Â 

Estabelecer preços mínimos para a laranja e para o suco.

 

•Â Â Â Â 

Incentivar a ampliação do mercado para a laranja e para o suco

 

•Â Â Â Â 

Criando um fundo nos moldes do Departamento de Citros da Florida.

 

•Â Â Â Â 

Promovendo, através de campanhas de marketing, a laranja e o suco brasileiros

 

•Â Â Â Â 

Organizando e incentivando o mercado interno

 

•Â Â Â Â 

Criar um sistema de informações que torne o setor mais transparente, como o existente na Flórida.

Instituir o Consecitrus com o objetivo de assegurar que as medidas de regulamentação sejam aplicadas e reduzir a assimetria e assegurar ao citricultor e demais elos da cadeia produtiva, uma participação justa na renda do setor, proporcional aos investimentos e riscos assumidos.

 

Credito: Associtrus