O mundo dos gigantes

15/05/2010
Análise: Marcos Fava Neves - O Estado de S.Paulo
Por coincidências da vida, eu fiz o artigo que comentava, neste mesmo Estadão, a saída da Cargill do sistema agroindustrial da laranja, em 2004. Já se vão, lamentavelmente, sete anos. Naquele momento, passávamos a quatro empresas processadoras de suco de laranja. Ficaram Citrosuco, Cutrale, Citrovita e Coimbra (Dreyfus). Aqui em Fortaleza, onde vim para uma palestra, me ligam pedindo para comentar a notícia, que, para quem acompanha o mercado, já não era nova, da associação entre a Citrosuco e a Citrovita - agora, publicamente anunciada. A análise é, rigorosamente, a mesma. O leitor pode achar o artigo de 2004 no portal do Estadão e somente mudar os nomes das empresas e atualizá-lo.

Este movimento está alinhado com os outros movimentos diários de concentração para competir num mundo de gigantes, tal como o JBS, que hoje abate 25% dos bois do mundo, e a BRF (Sadia e Perdigão). O setor industrial de suco de laranja no Brasil é extremamente concentrado, ficando agora praticamente com três empresas.

Isto, de um lado, representa vantagens do ponto de vista operacional, pois otimiza estrutura das duas empresas, reduz seus custos e permite às mesmas ficarem mais competitivas para enfrentar as mudanças que este mercado, já maduro, vem enfrentando no mundo. O suco de laranja é um produto que vem sofrendo concorrência cada vez maior de outras bebidas, como as águas flavorizadas, sucos de outras frutas, bebidas a base de frutas, energéticos, água de coco, chás e diversas outras.

Fora isto, aumenta a concentração dos engarrafadores de sucos, com destaque para a Coca-Cola e a Pepsi. Estas, por sua vez, vendem o suco para um varejo cada vez mais concentrado, cada vez mais dependente das marcas próprias. Enfim, pressão para todos os lados e um cenário cheio de nuvens para este setor, onde o nosso País apresenta uma liderança absoluta, com quase 90% do mercado mundial.

Os pontos que nos trazem preocupação são a perda de empregos dentro das duas empresas, que passarão a ter gestão única nos ativos compartilhados. Outra preocupação é nas operações de compra de frutas, pois a associação pode levar à redução na competição. E para contrabalançar isso, vem a recomendação que já dei neste mesmo jornal, há um mês: temos de trabalhar para contratos estáveis, baseados em sólidos solúveis, em preços internacionais transparentes e confiáveis, para que tanto produtores como indústrias tenham previsibilidade, confiança e possam otimizar investimentos, compartilhar ações, reduzir desperdícios e olhar cada vez mais o prisma da tentativa de desenvolvimento de novos mercados, e não perderem tempo com uma agenda interna de conflitos.

Além disso, a citricultura tem enorme tarefa de desenvolvimento do mercado interno, tanto de frutas como de sucos frescos, um canal alternativo para a indústria.

É PROFESSOR TITULAR DA FEA/USP (RIBEIRÃO PRETO)


Fonte: Estadão