Pronunciamento do Senador Suplicy na tribuna do Senado sobre a citricultura brasileira.

28/08/2006
O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT – SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Senador Roberto Cavalcanti, eu vou tratar de diversos assuntos. Em primeiro lugar, eu gostaria de analisar uma decisão muito importante que foi divulgada no dia de hoje, relacionada à indústria da laranja e à produção dos citricultores brasileiros. A má notícia é que as indústrias de suco de laranja aceitaram pagar indenização de R$100 milhões ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica para se livrar de um processo por formação de cartel na aquisição de laranja dos produtores. Se o acordo for fechado, será a primeira vez na história da defesa da concorrência do País que um setor pagará para encerrar uma investigação dos órgãos públicos. Pelos termos do acordo, as indústrias se comprometerão ainda a acabar com a suposta prática de cartel, o que é considerado crime contra a ordem econômica, por impedir a competição. O fechamento do acordo ainda depende da concordância dos conselheiros do Cade. A Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça enviou, ontem, ao Conselho um relatório das apurações feitas até agora e as sugestões do setor privado para o possível acordo. O pagamento da multa ou indenização, como o Cade prefere chamar, foi uma condição imposta pelas autoridades para negociar. A investigação foi iniciada em 1999, com base em denúncia de citricultores, pois a Cargil, a Cutrale, a Citrosuco, a Coimbra, a Citrovita, a Montecitros, além da própria Associação Brasileira dos Exportadores de Cítricos (Abecitrus), estavam sendo acusadas pelos produtores de laranja de dividirem o mercado e fixarem os mesmos preços de compra da fruta in natura. O valor de R$100 milhões foi estabelecido há 15 dias. A posição da SDE e do Cade é sólida na direção de se manter esse valor de R$100 milhões. “Como 85% dos recursos retornam para o setor produtivo na forma de financiamento aos pequenos e médios citricultores, a indústria vai aceitar” – disse ao jornal O Estado de S. Paulo o Presidente da Abecitrus, Sr. Ademerval Garcia, conforme informa a Agência Estado em matéria de Isabel Sobral. O Relator do caso no Cade, Conselheiro Luís Fernando Rigato, vai, agora, estudar o processo e ouvir a opinião da Procuradoria-Geral do Cade e do Ministério Público Federal, para apresentar o seu parecer sobre a possibilidade de um acordo ou não ao plenário do Conselho. Os demais integrantes do Conselho terão de homologar a proposta para que ela possa valer. A expectativa dos empresários envolvidos é de que até setembro o assunto seja julgado. Se for firmado o acordo, a intenção do Cade é destinar R$85 milhões da indenização a projetos de pesquisa tecnológica e de desenvolvimento da produção de laranja, por meio de um fundo de defesa da citricultura. Em princípio, o Cade defende que esse fundo tenha a participação majoritária de citricultores em sua administração. Os R$15 milhões restantes devem ser destinados a outros fundos de pesquisa e de desenvolvimento do setor, ainda a serem definidos. Segundo Daniel Goldberg, titular da SDE, o Governo quer usar, sempre que possível, a cobrança de valores em troca da extinção de processos de investigação e assim tornar o sistema de defesa da concorrência mais eficiente. Entre 2000 e 2006, considerando todo o tipo de multa aplicada pelo Cade, o sistema recebeu apenas R$31 milhões. É muito importante que o Conselho de Desenvolvimento Econômico esteja atento a essa questão que tem sido acompanhada por inúmeros Senadores desta Casa, inclusive pelo Líder do Governo, Senador Aloizio Mercadante, que promoveu inúmeras reuniões entre os produtores de suco de laranja, os agricultores e os citricultores. Mas é preciso que o Cade tenha a devida atenção para, de fato, ouvir as aspirações dos citricultores. Para se firmar qualquer entendimento é preciso ouvir efetivamente a opinião dos produtores de laranja. A Associtrus, em comunicado de hoje, alerta os citricultores para a importância da seqüência das discussões sobre a implementação deste chamado consenso, Consecitrus, para a próxima safra, considerando que o bônus de US$0,50 proposto pelas indústrias para esta safra para resolver os problemas do setor produtivo, vai muito além de um reajuste imediato de 14% por uma safra. A pressão das indústrias para que os citricultores prorroguem os seus contratos por dois ou mais anos, muitas vezes com preços inferiores aos US$4, fará com que essa bonificação seja devolvida, já na próxima safra, para as processadoras. Em sete meses de negociações, a Associtrus sempre lutou para que os citricultores ganhassem, ao menos, o valor referente ao custo de produção que, em São Paulo, segundo a associação, chega a R$15,00 por caixa de 40,8 quilos, e para que fosse implementado o Consecitrus como instrumento regulador dos preços aos produtores nas próximas safras. A oportunidade que os produtores tinham em mãos era imperdível, assim foi considerada pela Associtrus, por conta das pressões sofridas pela indústria, pela Operação Fanta. A Operação Fanta foi aquela determinada pelos órgãos controladores e pela própria Polícia Federal e acabou achando evidência de procedimentos contrários à concorrência por parte das empresas produtoras de suco de laranja. A Associtrus contesta o acordo feito entre a Federação de Agricultura do Estado de São Paulo (Faesp), o Governo e a indústria porque entendem que o reajuste proposto para esta safra não garantirá a sobrevivência do pequeno e médio produtor na citricultura. Diz o Presidente da Associtrus, Flávio Viegas, que em 15 anos de cartel, 15 mil citricultores foram expulsos do setor e, nos próximos anos, outros 10 mil serão expulsos e perderão o seu patrimônio. Ora, a contestação da representatividade da Associtrus, pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), como argumento para que a juíza Cristiane Pedrezoli, da 17ª Vara da Justiça Federal de Brasília, cassasse a liminar que ela mesma havia concedida há cerca de dez dias, será rebatida pela Associtrus. Diz o Sr. Flávio Viegas que associações legalmente constituídas têm autoridade inata atribuída pela Constituição Federal para representar seus membros. A Associtrus possui 942 citricultores cadastrados e não apenas 50, como argumenta o Cade. “Teríamos mais de 2 mil associados se muitos deles não tivessem medo de oficializar a filiação, temendo represálias das indústrias”, diz Viegas. O Cade sempre reconheceu a representatividade da Associtrus tanto que iniciou, por meio delas, negociações para a elaboração do Consecitrus. Técnicos do Cade e do SDE estiveram na sede da Associação, em Bebedouro, quando precisaram de declarações de citricultores para a investigações de cartelização da indústria de suco. Eu mesmo, Sr. Presidente Roberto Cavalcanti, fui um dos autores de requerimentos para que houvesse reuniões, inclusive no interior de São Paulo, como em Bebedouro, para que os membros do Cade ouvissem tanto os citricultores, os produtores de sucos e as próprias autoridades, como o Ministro Roberto Rodrigues, então da Agricultura, que foi, em mais de uma ocasião, a essas reuniões, ouvindo a todos. A multa de R$100 milhões proposta pelo Cade para que as investigações sejam encerradas e os documentos apreendidos na Operação Fanta sejam devolvidos às indústrias não significa nada diante dos mais de US$6 bilhões que foram retirados dos citricultores em 15 anos de cartel, segundo a Associtrus. A associação pede o apoio do produtor, por meio de fax, com o objetivo de demonstrar a insatisfação do setor produtivo com o reajuste de US$4, que corresponde a R$8,60 e não cobre nem o custo dos insumos, pois, segundo a Associtrus o custo, hoje, de produção de laranjas, chega a R$15,00 por caixa de 40,8 quilos. Espero, Sr. Presidente – graças aos esforços do ex-Líder do Governo, Senador Aloizio Mercadante, que se empenhou em promover o entendimento –, que se chegue efetivamente a um entendimento que leve, na devida conta, a opinião dos citricultores, tanto os de São Paulo como os da Região Nordeste, da Região Sul, da Região Centro-Oeste, enfim, todos os produtores de suco de laranja do País. Felizmente, o Brasil é hoje um dos maiores produtores de laranja e de suco de laranja no mundo. Somos grandes exportadores, mas é preciso que os órgãos responsáveis pelo abuso de concorrência no Brasil, como a Secretaria de Direito Econômico e o Cade, estejam atentos para ouvir o setor produtivo de laranjas.