05/08/2010
ROG?RIO CEZAR DE CERQUEIRA LEITE

As cr?ticas feitas ao deputado Aldo Rebelo s?o injustas, pois os n?meros mostram que a agricultura familiar seria beneficiada por sua proposta

Um dos principais pontos de conflito em torno da proposta da nova legisla??o florestal, atualmente em tramita??o no Congresso, se refere ? preserva??o de matas ciliares (aquelas que se desenvolvem ao longo de rios, riachos, lagos etc). Uma faixa de 30 metros deveria ser preservada, de acordo com o desejo de ambientalistas, independentemente do tamanho da propriedade, da regi?o etc.

A proposta inicial do deputado Aldo Rebelo para a nova legisla??o florestal interfere com essa doutrina inflex?vel. Foi ele ent?o atacado violentamente, como, ali?s, ? de h?bito, por ONGs e ambientalistas avulsos, acusado de estar fazendo o jogo dos ruralistas.

Para analisar esse problema ?tico, recorremos ? obra de Espinoza, principalmente ?quela intitulada "Ethica Ordine Geometrico Demonstrata". Um rio que corta ou ladeia uma propriedade cresce linearmente com as dimens?es de uma propriedade, enquanto sua ?rea cresce com o quadrado de uma de suas dimens?es, se a propriedade aumentar mantendo sua forma geom?trica.

Com isso, perdas de terra decrescem geometricamente com o aumento das dimens?es de uma propriedade. Tomemos um exemplo: uma propriedade quadrada de um hectare, ladeada por um rio em um dos lados, perderia 30% da ?rea para cultivo, enquanto uma outra ?rea com 10 mil hectares, com a mesma geometria, tem apenas 0,3% de sua ?rea preservada.

Nessas condi?es, podemos concluir que, mesmo esquecendo o passado implacavelmente reto do deputado Aldo Rebelo, as cr?ticas a ele feitas s?o injustas, pois os n?meros demonstram que as beneficiadas pela sua proposta seriam as pequenas propriedades e a agricultura familiar, n?o os ruralistas, o latif?ndio, a agroind?stria. ? um resultado incontest?vel, pois ? pura geometria.

Essa irracional exacerba??o de ?nimos ocorre principalmente quando provas concretas n?o existem. O ambientalismo brasileiro acabar? se desmoralizando se continuar nessa rota dogm?tica. ? preciso lembrar que, afinal, o homem tamb?m ? esp?cie a ser preservada.

A segunda quest?o pol?mica foi a remo??o da obrigatoriedade de reflorestamento de ?reas desmatadas. Ora, esta seria penalidade retroativa e, portanto, juridicamente contest?vel, al?m de invi?vel na pr?tica. Embora desmatar na regi?o da Amaz?nia seja crime, exigir reflorestamento retroativamente seria enfraquecer a legisla??o para aplica?es futuras.

Por outro lado, tamb?m ? uma infelicidade que se avoque neste s?culo 21 a import?ncia econ?mica da biodiversidade. Os cientistas, os tecn?logos e os empres?rios brasileiros j? s?o capazes de desenvolver e produzir novas mol?culas.

At? meados do s?culo passado, o homem recorria ? natureza para obter produtos medicinais e outros.

Hoje, a intelig?ncia e a dilig?ncia humana fizeram com que cri?ssemos nossos f?rmacos a partir de mat?rias-primas abundantes, inclusive da biomassa, por s?nteses de mol?culas complexas, tornando obsoletos os m?todos extrativistas, e sem recorrer ? criatividade err?tica da natureza, cujas cria?es servem aos seus pr?prios prop?sitos, e n?o aos da humanidade.

ROG?RIO CEZAR DE CERQUEIRA LEITE, 78, f?sico, ? professor em?rito da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), presidente do Conselho de Administra??o da ABTLuS (Associa??o Brasileira de Tecnologia de Luz S?ncrotron) e membro do Conselho Editorial da Folha.