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A citricultura e a verdade
13 de outubro | 2005
“O que é escrito ou falado uma única vez permanece rigorosamente inédito” escreveu o ex-ministro Pedro Malan citando Nelson Rodrigues. Por outro lado, atribui-se a Goebbels a frase: “Uma mentira repetida diversas vezes torna-se verdade”.
A mídia divulgou, nos últimos dias, vários artigos que colocavam o setor citrícola como um dos setores que estão se safando da crise que atinge a agropecuária brasileira. Essa impressão tem sido divulgada por profissionais respeitados, porém desinformados graças à Abecitrus, que procura manipular as informações sobre o mercado de acordo com seus interesses.
A agropecuária brasileira, por falta de organização e por erros que tem cometido nas últimas décadas, vem tornando as citações acima cada vez mais verdadeiras.
O caso da citricultura é emblemático. Os citricultores viveram uma década de grande crescimento e prosperidade, do final dos anos setenta até o final dos anos 80, mas há quase duas décadas vêm sofrendo um processo de exclusão e concentração conduzido pelo setor de processamento de citros. Impondo preços aviltantes para a laranja e manipulando os contratos ao seu bel-prazer, a indústria processadora vem sistematicamente expulsando os pequenos e médios citricultores e, com os recursos extorquidos, financia seus novos pomares. Esta informação é confirmada por números: segundo o LUPA da Secretaria da Agricultura, em 1995 havia 35.879 propriedades produzindo citros no nosso Estado, sendo 74% delas com menos de 50 ha. Hoje se estima que o número de propriedades não atinja 10.000, ainda predominantemente formadas por pequenos produtores, que continuam sendo alijados do setor pela incompatibilidade entre preços e custos de produção.Os preços da laranja, embora tenham mostrado uma recuperação em relação aos preços praticados nos últimos anos, não cobrem os custos de produção, que têm crescido enormemente em função de fatores como queda de produtividade causada por pragas e doenças e pelo clima e crescimento dos custos de produção, agravados ultimamente pela redução dos financiamentos, pelas altas taxas de juros e sobretudo pela valorização do Real.
As planilhas de custo da Associtrus indicam que o custo de produção da laranja no Estado de São Paulo, por caixa de 40,8 kg, varia de R$ 12 para os pomares mais produtivos até R$ 14,8, para os pomares que estiverem com a produção média do Estado, mas a indústria tem pago preços inferiores a US$ 3,5, valor que, ao câmbio de hoje, não chega a R$ 8,00 por caixa.
Nas safras do período de 87/88 a 91/92, o preço de venda do suco de laranja foi superior a US$ 1.800,00 por t 65º, caindo para um patamar inferior a US$ 850,00 nos últimos anos – uma queda de 53% – enquanto o preço ao consumidor cresceu de uma média de US$ 0,96/l para US$ 1,16/l -aumento de 21%- no mesmo período. O que não comprova a tão propalada competência do oligopolizado e verticalizado setor de processamento de citros brasileiro.
Estão presentes os fatores econômicos para a recuperação, como a queda da produção e conseqüentemente dos estoques dos principais produtores – S Paulo e Flórida – e o aumento da demanda nos novos mercados do Leste Europeu e da Ásia. De acordo com relatório publicado pela Just Drinks, o mercado de sucos atingiu em 2004 um faturamento de US$ 90 bilhões, registrando, em relação a 2000, um crescimento de 24%, apoiado no reconhecimento de que os sucos são alimentos saudáveis, de baixo valor calórico e excelente fonte de vitaminas e compostos benéficos à saúde.
Se se restabelecesse o patamar de US$ 1800,00, o produtor poderia ser remunerado em valores superiores a US$ 6,00, que seriam compatíveis com os custos e os riscos atuais de produção.
(Flávio Viegas, presidente da Associtrus)