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Concorrência na mira das indústrias
16 de novembro | 2006
Clarice Chiquetto
DCI13/11/2006
Setores como o bancário e o de transporte rodoviário também deveriam ser incluídos entre os que estão no foco de investigação do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC), ao lado das indústrias de aço, bebidas e dos postos de gasolina. Essa é uma das mudanças processuais que poderiam tornar a atuação dos órgãos nacionais de defesa da concorrência mais efetiva e serão apresentadas em dezembro a representantes dos órgãos que compõem o SBDC pelo grupo de estudos de direito da concorrência formado na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e coordenado por João Grandino Rodas, ex-presidente do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), que, ao lado da Secretaria de Defesa da Concorrência (SDE) e da Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae), formam o Sistema.
?São algumas alterações pontuais que podem dar mais efetividade aos órgãos de Defesa da Concorrência. Mudanças simples, que podem surtir efeito a curto prazo, como esta, de incluir mais setores no foco das investigações, além dos que são sempre visados. O de transporte rodoviário e o bancário são dois bons exemplos?, opina o coordenador do grupo, cujos estudos a respeito do atual direito concorrencial brasileiro e de sua aplicação começaram na sede da Fiesp há quatro meses, em reuniões mensais.
A adoção de posturas diferentes das atuais por parte dos órgãos seria outro ponto essencial para dar mais efetividade ao sistema e às punições, segundo Rodas. Hoje, a maioria das multas aplicadas pelo Cade, por exemplo, está sendo discutida na Justiça e ainda não foi paga. Para tentar reverter esse quadro, uma das sugestões que deve ser apresentada em dezembro é a adoção de diferentes penas para aqueles que descumprirem as regras de concorrência leal, levando-se em conta o porte da empresa e possíveis reincidências. ?As punições deveriam ser aplicadas em um crescente, como é na Justiça do Trabalho, em que um funcionário não é demitido por justa causa na primeira falta cometida?, compara Grandino Rodas.
Segundo ele, um problema legislativo das penalidades aplicadas pelo Cade, e que não deve ser resolvido pelo anteprojeto de lei que está no Congresso Nacional e propõe mudanças estruturais ao SBDC, é o valor das multas. Pela legislação atual, elas são definidas em Ufirs e baseadas no faturamento das empresas; no anteprojeto, foram fixados valores em reais. As duas possibilidades são limitadas e injustas, no entendimento do ex-presidente. Ele entende que tanto na lei atual como no projeto não foi levado em conta o fato de que os órgãos de defesa da concorrência devem aplicar punições em empresas dos mais variados tamanhos ? e as penalidades para cada uma devem ser diferenciadas. ?Uma grande indústria não pode sofrer a mesma penalidade que uma empresa média. A pena que para algumas afeta pouco o orçamento anual pode ser capital para outras?, explica.
Brigas na Justiça
O grupo também deve sugerir ao Cade que convoque as empresas que discutem na Justiça as punições impostas pelo órgão para tentar alcançar um acordo, por meio do qual as punições poderiam ser reduzidas em troca da retirada dos processos.
A primeira vez que uma conciliação desse tipo foi realizada no Brasil foi na atual gestão do Cade, presidido desde 2004 por Elizabeth Farina. Há quase dois meses, a Microsoft Informática Ltda. e TBA Informática Ltda. aceitaram retirar a ação contra a Procuradoria Geral do Cade em troca de pagarem 80% do valor estipulado como multa (R$ 6,2 milhões) e de não precisarem publicar em jornais de grande circulação o acórdão do Conselho que condenou as empresas por conduta anticoncorrencial. A proposta de acordo foi apresentada por representantes das próprias companhias, que concordaram em pagar R$ 5 milhões para desistir de quatro contestações jurídicas.
Segundo Rodas, o valor foi maior que toda a média de pagamentos de punições recebidos pelo Cade entre 2000 e 2004. ?Este é um procedimento comum, por exemplo, nos Estados Unidos, onde é chamado de pleabargaining. Já que é direito das empresas questionarem na Justiça as penas aplicadas na esfera administrativa, o melhor a fazer, para tornar a atuação dos órgãos mais efetiva, é tentar chegar a esse tipo de acordo?, opina. Segundo o ex-presidente do Cade, um estudo publicado pela britânica Global Economic Review , prestigiada publicação internacional sobre Concorrência e Regulação, afirmava que o processo envolvendo as duas empresas de informática e o Cade ficaria na Justiça por cerca de 12 anos ? as empresas haviam entrado com o processo em 2004, depois de o caso ser analisado no Conselho por cinco anos.
Estudos permanentes
Nas reuniões já realizadas pelo grupo, foram debatidas pelos membros possibilidades de alterações legislativas e administrativas que ajudem especialmente o Conselho Administrativo a tornar sua atuação e suas punições mais efetivas. Por enquanto, explica Grandino Rodas, estão sendo focados os lícitos concorrenciais, cuja investigação e punição podem ser aperfeiçoadas, como nos casos de fixação de preços, cartelização e posições dominantes. No entendimento do grupo da Fiesp, o órgão dá mais ênfase hoje aos problemas gerados por fusões e aquisições, deixando de lado as más condutas, que são aparentemente menores, mas que podem causar grandes impactos para os setores que forem alvo desse tipo de comportamento, contrário à concorrência leal.
A previsão do grupo para o próximo semestre é debater possibilidades de alterações legislativas que sejam mais simples de ser realizadas e possam aperfeiçoar tanto a atuação do Cade como a das duas Secretarias.
Rodas explica que o atual anteprojeto de lei que está no Congresso traz mudanças estruturais grandes, que vão demorar para ser realmente efetivadas. Por isso, a intenção é sugerir pequenos aperfeiçoamentos ao texto que possam tornar menos complexas e mais efetivas as atuações dos órgãos de defesa da concorrência. Ainda não há definição sobre quais poderiam ser essas mudanças, pois os debates a respeito do assunto vão começar em janeiro, assim que as primeiras sugestões pontuais de mudanças de procedimentos forem apresentadas em dezembro. Grandino Rodas ressalta que todos os empresários interessados em fazer sugestões ao grupo de estudos podem procurar a Fiesp para apontar suas colocações.