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Editorial
Consecitrus, riscos e oportunidades
01 de junho | 2013
A safra 2013/14 está iniciando-se com os mesmos problemas enfrentados nas safras passadas e tudo indica que a maior crise já enfrentada pela citricultura vai se estender na próxima safra. Dados desencontrados sobre produção, estoques, preços, entre outros, mantêm o produtor sem condições de fazer uma avaliação precisa das perspectivas para o seu negócio.
As estimativas de produção divulgadas pela Conab e Secretaria da Agricultura de SP, no seu primeiro relatório, apresentam uma estimativa de 327,852 milhões de caixas para São Paulo e Triângulo Mineiro, enquanto a CitrusBr divulga uma safra de 268,350 milhões de caixas para a mesma área. Uma diferença superior a 71 milhões de caixas, mais da metade da safra da Flórida- o segundo produtor mundial.
Esta diferença exige uma verificação mais aprofundada dos números; ao que tudo indica, a maior diferença está nos dados do parque citrícola. Os dados da Conab consideram cerca de 200 milhões de plantas em produção, enquanto a CitrusBr considera 162 milhões de plantas.
Uma diferença de tal proporção é inaceitável e exige explicações e ações no sentido de corrigir as discrepâncias.
Outro dado fundamental que também vem apresentando enormes discrepâncias é o que diz respeito aos estoques. O estoque inicial de julho de 2012 divulgado pela CitrusBr era de 555 mil t, enquanto o USDA apontava inicialmente para um número de 240 mil t, posteriormente corrigido para 440 mil t; mesmo após a correção, restou uma diferença superior a 26%. É importante frisar que números do USDA são fornecidos pela indústria. O governo teria auditado os estoques, porém os resultados não foram divulgados.
A safra passada iniciou-se com uma estimativa de 365 milhões de caixas e a indústria, alegando altos estoques, informava que não tinha condições de processar mais do que 250 milhões de caixas, criando uma enorme crise, que acarretou a perda de praticamente toda a fruta precoce e parte considerável da fruta tardia. Os produtores foram obrigados a entregar a sua fruta a preços que ficaram abaixo de R$6,00/cx, enquanto o custo econômico calculado pela Associtrus superava R$ 18,80/cx. Os baixos preços pagos incentivaram as indústrias a aumentar significativamente as compras e criaram condições para que continuem impondo aos citricultores preços abaixo do custo de produção, que vão acelerar o processo de exclusão dos pequenos e médios citricultores do setor.
A maior crise da citricultura foi criada sob o pretexto de queda da demanda mundial do suco de laranja. Porém o fato é que a oferta vem caindo mais do que a demanda, tanto que a Coca Cola, que desde 2011 tem demonstrado a preocupação com a falta de interesse dos produtores em ampliar os plantios, anunciou o investimento de US$ 2 bilhões no plantio de 10 mil ha de laranjas em parceria com a Cutrale e a Peace Rivers.
Outros fatos que desmentem os argumentos da indústria são o aumento do valor do suco de laranja e dos subprodutos, o que propiciou o aumento de 120% no valor de registro das exportações brasileiras de suco de laranja entre 2005 e 2012 e os altos preços recebidos pelos citricultores da Flórida que atingem cerca de R$24/ cx.
A conclusão evidente é que as indústrias cartelizadas e verticalizadas continuam a impor impunemente o seu poder econômico e de mercado sobre os produtores brasileiros, enquanto apresentam um comportamento completamente diferente na Flórida, onde controlam mais de 50% do processamento e têm estreitos vínculos com a Coca Cola e Pepsi Cola, que controlam o mercado mundial de sucos.
O Consecitrus e a atuação do CADE no processo sobre o cartel representam uma esperança de reequilíbrio do setor, porém a indústria está atuando no sentido de utilizar o Consecitrus para tentar um acordo, com o objetivo de evitar ou reduzir a punição no caso de condenação. Para isto está tentando criar e infiltrar no Consecitrus associações “amigas” que favoreceriam a aprovação de um conselho que lhes garantiria a continuidade do estado de coisas e esqueceria o passado, encerrando de maneira favorável o processo de cartel.
O Consecitrus proposto pela Associtrus terá representantes empenhados no restabelecimento da concorrência, redução da verticalização, no reequilíbrio das relações entre produtores e indústria, na transparência das informações, na participação dos produtores, proporcionalmente aos custos e riscos por eles incorridos na renda do setor, combate ao subfaturamento, evasão fiscal e cambial, entre outras ações necessárias para garantir a competitividade do setor e a criação e distribuição de empregos e renda, que estão sendo destruídos pelo modelo de citricultura que vem sendo imposto pela indústria.
O Consecitrus representa uma oportunidade, mas também um risco, se for controlado pela indústria como ocorreu com o Fundecitrus, do qual a Associtrus foi co-fundadora e depois foi substituída por produtores amigos da indústria, que pensam como ela e aprovam a política excludente praticada pelo cartel nos últimos 20 anos. Eles acreditam que serão por ela beneficiados quando restarem no setor as indústrias e seus 200 amigos, como nos antecipou um expoente da indústria em 2003. Na mesma ocasião as indústrias revelavam o plano de excluir do setor 92,5% dos citricultores então rotulados de “ineficientes” em editorial da Abecitrus de agosto de 2003, assinado pelo seu presidente “…, implicam em excluir do negócio a maioria dos agentes econômicos de baixa produtividade, isto é, pequenos produtores que hoje representam 92,5% dos citricultores brasileiros. O número deles, em dez anos, já se reduziu de 29 mil para 17 mil no Estado de São Paulo. São pessoas que têm uma tradição agrícola familiar de várias gerações, que deixaram de ser competitivas e demandam algum tipo de programa de realocação, para não contribuir com o inchaço das cidades e o agravamento dos problemas sociais no Brasil. É preciso que o governo organize as cadeias produtivas e, com elas, lidere programas que visem o redirecionamento das propriedades improdutivas, a exemplo do programa de racionalização da lavoura cafeeira (GERCA) levado a efeito nos anos 60, e que foi determinante para o crescimento da diversificada agroindústria nacional.”