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Discurso do Senador Eduardo Suplicy

17 de março | 2010

Discurso do Senador EDUARDO SUPLICY . Sem revisão do orador.) –


 


Sr. Presidente, considero importante voltar aqui a examinar um dos temas que, volta e meia e desde o início de 2000, tenho tratado na Casa. Refiro-me ao apelo dos produtores de suco de laranja do Estado de São Paulo – são muitos –, no sentido de evitar que haja um processo de concentração com repercussões negativas para os produtores de laranja, para os que trabalham na cultura da laranja, os trabalhadores, e que muitas vezes acabam criando situações muito difíceis em função da tendência das grandes empresas produtoras de suco de laranja atuarem em cartel.
Ora, Sr. Presidente, desde então, tivemos aqui e também em alguns lugares no interior de São Paulo inúmeras audiências, seja da parte da Associação dos Produtores de Laranja do Estado de São Paulo, seja também com a participação da sociedade rural brasileira dos mais diversos produtores e com a participação dos diretores das empresas de suco de laranja, ainda que, por vezes, tivéssemos dificuldades para que viessem os diretores dessas grandes empresas produtoras de suco a atender ao convite para as audiências públicas promovidas, seja em reuniões no interior do Estado de São Paulo, em diversas cidades, seja também aqui no âmbito da Comissão de Assuntos Econômicos.
Pois bem. O meu objetivo sempre foi o de procurar reverter o movimento de concentração no setor e instar os órgãos do Sistema Brasileiro da Concorrência a investigar as denúncias de formação de cartel no setor, movimento orquestrado de definição dos preços de compra da fruta produzida pelos pequenos e médios produtores, sobretudo. A despeito desses esforços e dos órgãos de defesa da concorrência, os resultados não têm sido suficientemente satisfatórios: a concentração e a verticalizaç
o, muitas vezes, avançaram, intensificaram-se.
Atualmente, quatro grupos econômicos centralizam o processamento do suco de laranja: a Cutrale, a Citrosuco, a Citrovita e Louis Dreyfus.
Segundo a Associação dos Produtores de Laranja, a Associtrus, as empresas processadoras detinham menos de 600 mil pés de laranja nos anos 70. Hoje, esse número está próximo de 50 milhões de pés de laranja. As mesmas empresas continuam adquirindo fazendas e plantam cerca de dois milhões e meio de árvores por ano. No Estado de São Paulo, estima-se que 50% das frutas destinadas ao processamento são produzidas em propriedades da própria indústria produtora de suco de laranja. Isso atribui a esses compradores um elevado poder na fixação dos preços de aquisição dos produtos.
As hipóteses acerca da possível cartelização da citricultura paulista assumem agora contornos mais precisos. A Folha de S.Paulo, de 15 de março, publicou entrevista de um ex-dir etor de uma das empresas de suco de laranja, que revela detalhes do modo pelo qual as empresas processadoras da fruta in natura orquestravam a definição do preço a ser pago aos produtores e a definição de preço para a venda do suco no exterior.
O Sr. Dino Tofini responde à questão da Folha de S.Paulo:
FOLHA – Quem teve a ideia de formar e quando começou o cartel na indústria de suco de laranja?
DINO TOFINI – A ideia foi de José Luis Cutrale [sócio-proprietário da Cutrale] no início da década de 90. Ele chamou as indústrias do setor para fazer uma composição com o objetivo de comprar a laranja por um preço mais acessível para a indústria.
FOLHA – Qual era o objetivo?
TOFINI – Era jogar todo o ônus possível do negócio para o agricultor, permitir a compra da matéria prima em condições que o cartel determinasse. O problema foi tão sério que matou a citricultura paulista.
FOLHA – Quem participava das reuniões para tratar do cartel?
TOFINI – Só os donos das empresas e os executivos mais importantes, os seniores.
FOLHA – Onde eram as reuniões?
TOFINI – Na Abecitrus, que era a associação do setor, e comandada por Ademerval Garcia. A capacidade de moagem dessas indústrias era três a quatro vezes maior do que a capacidade da safra brasileira. A Citrosuco sozinha era capaz de moer um terço da safra brasileira, de 300 milhões de caixas por ano. Era e ainda é um negócio gigante, de bilhões de dólares.
FOLHA – Como foi feito o acordo?
TOFINI – Nós nos reuníamos todas as quartas-feiras e aí decidíamos quem ia comprar de quem, de qual produtor. Cada indústria tinha o seu quintal. Dividimos o Estado de São Paulo em vários quintais e ninguém podia se meter no quintal do outro. O quintal da Cutrale era praticamente tod o o Estado. A Citrovita ficava mais com a região de Matão. Nós, com a região de Limeira. O meu quintal tinha cerca de 250 a 300 citricultores. O combinado, na época, era pagar de US$3,20 pela caixa de laranja (de 40,8 quilos).
FOLHA – Esse acerto de divisão de produtores era colocado no papel?
TOFINI – Não, era verbal. E quem não respeitava o quintal do vizinho sofria represálias.
FOLHA – Qual era a represália feita a quem não quisesse participa do suposto cartel?
DINO TOFINI – Levantar o preço da fruta a níveis absurdos para que o empresário não pudesse comprar a laranja.
FOLHA – O senhor concordou com essa prática na época?
TOFINI – Não só concordei como também trabalhei a favor, porque era muito interessante para mim como industrial.


 


E por aí segue.
É importante aqui relatar, Sr. Presidente, e eu vou pedir que seja transcrita na íntegra essa entrevista, mas ainda hoje o jornal Valor Econômico tem uma matéria de primeira página que relata que a Citrosuco e a Citrovita costuram a integração de suas operações. Diz a matéria de Fernando Lopes, Nelson Niero, Francisco Góes e Paulo de Tarso Lyra, que


Os grupos Fischer e Votorantim negociam unir suas operações no segmento do suco de laranja, onde atuam por meio das empresas Citrosuco e Citrovita, respectivamente. Fontes gabaritadas deste mercado afirmam que há conversações em curso e que elas avançaram nos dois últimos meses. Procuradas, a Citrovita afirmou que não comenta rumores de mercado e a Citrosuco não se pronunciou.
O Valor apurou que o plano envolve todo o negócio de suco das empresas, incluindo fábricas, estrutura logística e pomares de laranja em produção ou em desenvolvimento nas fazendas próprias de ambas. As terras em si não estão no pacote.


 


Sr. Presidente, eu acho também importante que esta matéria possa ser aqui colocada, e peço a gentileza de que seja transcrita como parte de meu pronunciamento.
Hoje, a Secretaria de Direito Econômico avançou numa nova fase de investigações com respeito às empresas de suco de laranja.
A Secretaria hoje – estava previsto para hoje de manhã, segundo o que o Presidente do Cade, Arthur Badin, me informou ontem – iria deslacrar os dados da empresa Citrovita, investigada pela Operação Fanta, da Polícia Federal, realizada em 2006. O Diário Oficial também vai trazer o nome do empresário Dino Tofini, da Citrus, como parte integrante de uma nova linha de investigações sobre o tema.
Espero, Sr. Presidente, que a Secretaria de Direito Econômico e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica, o Cade, possam, de uma forma isenta, fazer a averiguação dessa evolução e possam responder aquilo que significa a defesa dos interesse s do sistema de concorrência, a defesa dos produtores de laranja de todo o Brasil, inclusive o Estado de São Paulo.
Assinalo que Fátima Fernandes e Claudia Rolli são as jornalistas da Folha de S.Paulo que entrevistaram Dino Tofini.
Assim, Sr. Presidente, constitui dever de todos nós, Senadores, em especial da Comissão de Assuntos Econômicos, acompanhar, ressaltar, sugerir à Secretaria de Direito Econômico e ao Cade que acompanhem de perto e evitem as situações de concentração de poder econômico.
Inclusive, cabe ressaltar, é possível que no Cade haja um número de conselheiros que estejam impedidos de analisar situações de empresa de suco de laranja por terem, de alguma forma, ligações com essas empresas. Isso também deve ser objeto de atenção da Comissão de Assuntos Econômicos, para que possa haver a devida isenção por parte desses órgãos.
Muito obrigado, Sr. Presidente.