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Na festa da laranja, produtor fica fora

17 de março | 2007

Em 12 meses, preço do produto já aumentou 60% em dólar e 45% e, real, mas ganho não chega ao citricultor
Márcia De Chiara
ENVIADA ESPECIAL CATANDUVA (SP)

O produtor Antonio Osório Fachini, de 58 anos, que passou mais da metade da sua vida plantando laranja na região de Catanduva, no interior do Estado de São Paulo, não tem dúvida de que a citricultura nunca teve perspectivas tão favoráveis como hoje. Mas Fachini e a maioria dos citricultores também não têm dúvida de que o cenário favorável da atividade não teve impacto positivo no bolso do produtor. “O citricultor ainda não foi beneficiado pela alta do preço do suco e da laranja. Isso ficou só no papel.”

Segundo especialistas, hoje essa conjugação positiva de fatores supera até mesmo o cenário da década de 80, quando ocorreram sucessivas geadas na Flórida (EUA) e o setor viveu anos dourados.

Na semana passada, por exemplo, o preço do suco de laranja congelado e concentrado na Bolsa de Nova York bateu a casa de US$ 2,8 mil por tonelada – 193 centavos de dólar por libra-peso -, a maior cotação em 16 anos. Em 12 meses, o produto já aumentou 60% em dólar e 45% em real. Nesse período, o preço da caixa de laranja no atacado de São Paulo cresceu 17%, de R$ 11,20 para R$ 13,20.

Enquanto isso, produtores como Fachini, que cultiva mil hectares de laranja espalhados em seis propriedades no norte paulista, receberam da indústria que extrai o suco de laranja US$ 3,5 por caixa, ou R$ 7,70, conforme contratos assinados. “Isso mal cobre o custo variável da caixa”, diz o produtor.

Ele tenta, assim como tantos outros, negociar com a indústria um preço adicional pela laranja. Nas contas do vice-presidente da Associação Brasileira dos Citricultores (Associtrus), Douglas Eric Kowarick, o custo variável por caixa é de R$ 11.

A disparada dos preços do suco e da laranja indica uma nova realidade para o setor, marcada pela menor oferta de fruta e de suco. O pano de fundo é o consumo mundial, que cresce na casa de 4,5%, depois de ter aumentado entre 2,5% e 3% nos últimos anos, diz o presidente da Associação Brasileira de Exportadores de Cítricos (Abecitrus), Ademerval Garcia.

Atingida pelos furacões, a próxima safra da Flórida, que garante o suprimento dos EUA – o maior consumidor mundial -, não deve passar de 130 milhões de caixas. Isso é um pouco mais da metade da última safra.

“O efeito do furacão equivale ao de uma geada prolongada”, diz Kowarich. Ele explica que, com a passagem de furacões, não só foram afetados os pomares em produção como também viveiros de mudas, por causa da disseminação de doenças. Isso deve prejudicar as safras futuras e garantir uma menor oferta de laranja para a indústria dos EUA nos próximos anos.

O Brasil, que é o maior produtor mundial de laranja, com a safra paulista respondendo por 80% da produção nacional, também terá uma oferta menor de fruta do que a inicialmente prevista. Afetada pela seca, a safra paulista 2006/2007 deve ficar em 357 milhões de caixas, ante a previsão de 360 milhões.

Fora o cenário de suprimento mais apertado e baixos estoques de suco na Flórida e no Brasil, os citricultores paulistas contam desta vez com um fator adicional a seu favor: a possibilidade de trocar a laranja pela cana, que avança no norte do Estado e é sinônimo de receita garantida. “A carta na manga do produtor é a cana”, diz Fachini.

Na Frucamp, um grupo formado por 36 citricultores que se uniram para vender a laranja para a indústria e do qual Fachini participa, 20% deles decidiram arrendar parte da área de pomares para cana. Fachini ainda resiste a essa mudança. “Sou um citricultor nato. Acredito que o bom senso da indústria prevaleça na negociação de preços.” Se a indústria não pagar um adicional ao produtor, ele acredita que será um tiro no pé. “Os fabricantes de suco precisam de matéria-prima.”

A crença do citricultor no cenário favorável aparece nos novos projetos. Para 2007, Fachini planeja ampliar em 150 hectares a área de produção de laranja. Para isso, pretende investir R$ 3,5 milhões