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RECORDAR É SEMPRE BOM!
19 de dezembro | 2007
ESTE TEXTO FOI PUBLICADO NO SITE DA ASSOCITRUS EM 02/12/2005
Posições fluidas e incertas
Após vários anos negando-se a discutir coletivamente com os citricultores um novo contrato, o sr. Ademerval Garcia convidou os diretores da Associtrus para uma reunião em , na 3 de fevereiro de 2003 qual surpreendentemente mostrou a disposição da indústria que representa de discutir um novo contrato coletivo, “tipo Consecana”, acenando, ao mesmo tempo, com a abertura para o retorno da Associtrus ao conselho do Fundecitrus , entidade da qual, apesar de co-fundadora, fora alijada numa das alterações de estatuto feitas nas sombras, como é praxe entre os sócios da Abecitrus. Nenhum dos dois assuntos avançou.
Após a tentativa de boicote à instalação da Câmara Setorial da Citricultura, disse, como foi registrado na revista Hortifruti de maio de 2005, que a indústria estava aberta para discutir um novo acordo coletivo e que o ambiente para a discussão seria a Câmara Setorial.
Apesar de reconhecer que a extinção do contrato-padrão, em 1994, contribuiu para aumentar a desigualdade na distribuição da renda ao longo da cadeia produtiva e que o retorno do sistema teria um efeito social mais justo, a Abecitrus participou de apenas duas reuniões do grupo indicado pela Câmara Setorial para discutir um novo acordo coletivo.
Lembrava que o novo acordo não significaria a homogeneização dos preços, pois o acordo ofereceria um piso e a negociação caso a caso continuaria. A vantagem, ainda nas palavras do sr. Ademerval, seria que o acordo abrangeria toda a cadeia, haveria um indicativo de renda que permitiria segurança e previsibilidade nos investimentos. Porém, já na segunda reunião, a Abecitrus negou-se a continuar participando das discussões, alegando estar impedida pelo acordo de cessação assinado pela indústria, em 1994, com o Cade, para se safar das penalidades a que estaria sujeita por formação de cartel. Apesar de não ter cumprido as principais restrições impostas pelo Cade, cumpriu fielmente as determinações que eram de interesse da indústria e “foi mais realista que o rei” ao aproveitar a oportunidade para, sem nenhuma compensação, transferir os custos, as obrigações e os riscos da colheita e transporte da laranja para os citricultores. Apesar de o acordo de cessação ter sido arquivado em 1998, a Abecitrus usou o pretexto para escapar ao compromisso assumido.
Agora, em mais uma mudança na fluida postura que a caracteriza, a Abecitrus volta a afirmar, segundo jornalistas que compareceram à entrevista coletiva de Ademerval Garcia, que não participará mais das negociações do Consecitrus.
A mesma atitude contorcionista foi adotada em relação ao Fundecitrus. Após ter informado que a indústria estava disposta a transferir para os citricultores a gestão do fundo, aparentemente mudou o discurso .
O Fundecitrus, nas mãos “zelosas” da indústria desde 1995, submergiu e vem sendo administrado como uma enorme “caixa-preta”, onde a origem e o destino dos fundos são mantidos sob total sigilo. Sabe-se que há muitos anos a indústria já não contribui de forma paritária e sim de acordo com uma fórmula secreta chamada “fórmula carneiro” .
Os próprios conselheiros, a maioria deles homens de confiança da “casa”, denunciaram que, na safra passada, a indústria recolheu aos cofres do fundo, dos recursos retirados dos produtores, a contribuição correspondente a 230 milhões de caixas, quando se sabe que foram processadas 340 milhões de caixas. Coincidentemente a diferença de 110 milhões de caixas é a produção estimada da indústria. Outro dado revelador é que, embora o recolhimento previsto, de R$ 0,18 por caixa sobre 340 milhões de caixas, devesse atingir um total de R$ 61,2 milhões, o orçamento votado pelo fundo era pouco superior a R$ 40 milhões, portanto previa que a contrapartida da indústria seria também sonegada.
Não bastando a pouco transparente gestão financeira, o fundo não é nada transparente no uso dos fundos arrecadados. Os projetos financiados não são tornados públicos e há suspeitas de uso privilegiado das informações.
O Fundecitrus fracassou na contenção da expansão do “amarelinho”, não foi capaz de identificar a tempo a “morte súbita”, que se originou em uma fazenda da indústria, e – a maior de todas as falhas – não foi capaz de detectar o aparecimento do “greening” que surgiu e se expandiu na região de Araraquara, debaixo do nariz do “estado maior” da citricultura. A relação de fatos que comprovam a incompetência com que vem sendo gerido
o Fundecitrus é interminável.
A má gestão dos destinos do nosso setor não se limita ao Fundecitrus e à Abecitrus. Mais de uma década de preços aviltantes expulsou mais de 25 mil citricultores do setor e transferiu sua renda para o plantio dos pomares próprios da indústria, destruiu 150 mil empregos e a economia dos principais municípios citrícolas.
Em meados da década de 80, o suco de laranja era comercializado acima de US$ 1.500,00 e a laranja era comprada a US$ 3,50 por caixa, na árvore. Estes valores corrigidos pelo CPI norte-americano corresponderiam a, respectivamente, US$ 3.000,00 e US$ 7,00. Naquela época, o custo do suco correspondia a cerca de 30% do preço de venda ao consumidor. Até recentemente o suco vinha sendo comercializado a US$ 900 e o preço da caixa de laranja abaixo de US$ 3,00, enquanto, devido às doenças, o aumento dos custos dos insumos e incorporação dos encargos de colheita e frete os custos de produção do citricultor saltaram para US$ 6,00.
Assim, além de inviabilizar os citricultores, a nossa indústria acirrou a ira dos citricultores norte-americanos, que, apesar de todo protecionismo, encontraram o pretexto de que precisavam para aumentá-lo ainda mais, com mais uma ação antidumping contra a nossa citricultura. A indústria está ameaçando transferir para os citricultores a pena que ela merecidamente recebeu. E alega, cinicamente, que “liquidação” de estoque não é dumping!
Atualmente, mesmo diante de um evidente desequilíbrio entre oferta e demanda causado pelos baixos preços, doenças, pragas e furacões que consumiram os estoques e reduziram a produção a um nível inferior ao consumo e provocaram a duplicação dos preços internacionais do suco de laranja, a indústria ainda tenta manter os preços ao produtor abaixo de 50% do custo de produção. Dando um “tiro no pé”, mas locupletando-se à custa do citricultor.
por Flávio de Carvalho Pinto Viegas*
* Presidente da Associação Brasileira de Citricultores (Associtrus)